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terça-feira, abril 12, 2016

A PRIMEIRA GRANDE CONQUISTA

Minha gente, o  celotex ou jogo de botões veio a mim nos idos de 1947, quando presenciei na casa de uma vizinha, dois rapazes jogando sobre uma pequena mesa, utilizando-se de botões de capa. Lembro-me que a bola era uma conta de madrepérola, dessas usadas nos vestidos das mulheres. Quando caia no chão, saltava que era uma beleza.
Botões de roupa deram origem ao futebol de botão  
Alguns botões tinham nomes de atletas de futebol grafados em sua superfície. Os dois rapazes, Tota Virães e Aluízio Portela, jogavam com seus times, cujos nomes correspondiam aos times de futebol pelos quais torciam. Tota era Santa Cruz, que acabava de se sagrar campeão pernambucano de 1947 e Aló,  como  Aloísio  era chamado pela rapaziada, era Náutico, o alvirrubro dos Aflitos.
Goleiro de caixa de fósforos devidamente paramentado
Após esse fato, alguns dias depois, vi meu irmão, cinco anos mais velho do que eu, preparando um time, com botões de palitó e pedi para que fizesse um pra mim. Nasceu assim o América, com o goleiro de caixa de fósforo, Amauri. A zaga, Deusdedith e Biu. A linha de halves era formada por Pedrinho, Capuco e Astrogildo e, no ataque, Julinho, Valdeque, Buarque, Valeriano e Dija. 
Os primeiros jogos foram horríveis, com derrotas acachapantes.
Campo sobre o piso, os primeiros passos no botão.
No fim da rua, morava um garoto caneludo, de nome Divanilton, dois ou três anos mais velho, cujo time, era o Sport. Contra esse adversário, não tinha jeito. Era sova e mais sova. A regra era a leva-leva e o campo, bem diminuto, ficava sobre a calçada.
Formato do botão Amorim, o infernal
O destaque do time do Sport era um botão de nome Amorim, que fazia gol adoidado e infernizada meu juízo. Passava dias e mais dias pensando como me livrar de Amorim. Algumas vezes propus trocá-lo por botões do meu time. Em outros, apelei até para permutas por gibis  ou mesmo coleções de brindes, muito em voga na época. Não havia nada que demovesse Divanilton e Amorim continuava a fazer gols e mais gols em minha barra.
No tempo das matinées do cinema
Porém, havia o domingo, o dia sagrado das matinês. Podia acontecer de tudo, mas o pior castigo era você ficar privado de ir ao cinema no domingo de tarde para assistir, tão logo o filme terminasse, o seriado, com seus famosos episódios. O Falcão da Floresta era a série do momento e todo domingo o comentário era um : como o mocinho iria se safar do perigo.
Cena do último episódio do Falcão da Floresta
Foi então que chega o dia do último capítulo do seriado e eis que Divanilton, minutos antes de irmos para a matinê, me procura, alegando que tinha gasto o dinheiro que recebera da mãe e assim não iria poder assistir ao fim do tão esperado seriado. Meu dinheiro também era mirrado, dava para pagar o ingresso do cinema e comprar uma caixinha de chicletes, Divanilton, no desespero, propôs: eu te dou Amorim,  pelo ingresso
Pego de surpreso, fiquei numa encruzilhada: perder o último capítulo do Falcão da Floresta ou desistir para sempre de Amorim. 
Andei prá e prá e, finalmente, aceitei a troca, sem antes exigir de Divanilton, que me contasse todo o capítulo da série. E, assim, Amorim, o famoso Amorim, ficou sendo o centro avante do América que nunca mais iria infernizar minha vida.

Time de botões de capa dos dias de hoje
Hoje, passado todos esses anos, percebo que o jogo de botões, dessa forma, entrou definitivamente em minhas veias. Amorim foi levado pela poeira do tempo, mas foi sem sombra de dúvidas a minha primeira grande conquista.
(Mais uma estorinha do jogo de botão, vivida por este blogueiro. Texto escrito no ano de 2006).

2 comentários:

SAMBAQUY, Adauto Celso disse...

Meu amigo Abiud,
Estas histórias são sempre maravilhosas. E a incrível coincidência de sua apresentação ao futebol de mesa idêntica a minha, pois conheci o futebol de mesa em 1947. Quanta beleza aconteceu em nossas vidas durante todos os quase setenta anos de vivência botonistica. Toda sorte de botões passou por nossas mãos, dos quais, guardo uma ponta de saudade, pois sempre doei muitos times a quem não tinha condições de comprar. Lembro que, quando trouxe para Brusque o futebol de mesa, fiz várias doações entre as quais os dois filhos de um funcionário do Clube Atlético Carlos Renaux (o mais antigo de Santa Catarina) que não tinham condições de comprar. O pai era massagista do clube e fazia bicos para conseguir colocar comida em casa. Os meninos andavam com alguns, que jogavam entre os infantis da Associação Brusquense de Futebol de Mesa. Os olhos dos dois se encheram de lágrimas e vibraram com seus times.
Acredito que esta história, escrita em 2006, deve ter sequencia e muitas outras virão enriquecer a história de nosso esporte.
Abraço gaúcho e colorado.

Abiud Gomes disse...

Amigão Sambaquy, mesmo me gabando de ter uma boa memória, não consigo me lembrar como meus primeiros times se perderam no tempo. Na adolescência, tive três times de chifres (Portuguesa, Palmeiras e Náutico) e não me recordo que fim levaram. A rigor, somente, a partir de 1965, depois de uma pausa de mais de cinco anos, quando mandei fazer um time alvirrubro, é que nunca mais me afastei do botão, até os dias atuais. Abração pernambucano.